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Arquivo Nacional é registrado no Memória do Mundo da Unesco com acervo de Bertha Lutz
Brasília, 25/10/18 - O Arquivo Nacional concorreu e ganhou seu registro na edição brasileira do Programa Memória do Mundo da Unesco por dois acervos, um sobre feminismo, ciência e política – o legado Bertha Lutz e outro sobre Segurança e Informações da Fundação Nacional do Índio (veja aqui).
O programa Memória do Mundo foi criado em 1992 e reconhece como patrimônio da humanidade documentos, arquivos e bibliotecas de grande valor internacional, regional e nacional, inscrevendo-os nos registros e conferindo-lhes certificados que os identificam. O objetivo é estimular a preservação e a ampla difusão desses acervos, contribuindo, assim, para despertar a consciência coletiva para o patrimônio documental da humanidade.
A candidatura Feminismo, ciência e política – o legado Bertha Lutz apresenta acervos de quatro instituições (Arquivo Nacional; Arquivo Histórico do Itamaraty; Centro de Documentação e Informação da Câmara dos Deputados e Centro de Memória da Universidade Estadual de Campinas – CMU/UNICAMP) cujo ponto de convergência é a atuação da bióloga, deputada e feminista brasileira Bertha Lutz (1894-1976), uma das fundadoras da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino.
Zoóloga de profissão, Bertha Lutz tornou-se, em 1919, secretária do Museu Nacional do Rio de Janeiro, fato notório tendo em vista que na época o acesso ao funcionalismo público ainda era vedado às mulheres. Em 1922, foi representante do Brasil na assembleia geral da Liga das Mulheres Eleitoras, realizada nos Estados Unidos, sendo eleita vice-presidenta da Sociedade Pan-Americana. Ainda em 1922, como delegada do Museu Nacional ao Congresso de Educação, garantiu ingresso das meninas no Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro.
Bacharelou-se em Direito pela Faculdade de Direito do Rio de Janeiro, em 1933, e publicou A nacionalidade da mulher casada, na qual defendia os direitos jurídicos da mulher. Neste mesmo ano se candidatou a uma vaga na Assembleia Nacional Constituinte de 1934, mas não conseguiu a eleição. No pleito do ano seguinte, tentou mais uma vez e obteve uma suplência. Assumiu o mandato em julho de 1936, devido à morte do titular, deputado Cândido Pessoa. Em sua atuação, lutou pela mudança de legislação trabalhista referente à mulher e ao menor, propôs igualdade salarial, licença de três meses à gestante, redução da jornada de trabalho - então de 13 horas. Permaneceu na Câmara até 1937, ocasião em que o regime do Estado Novo (1937-45) dissolve os órgãos legislativos do país. Bertha Lutz participou também da Conferência de São Francisco, que criou a Organização das Nações Unidas - ONU, em 1945. Única mulher da delegação brasileira ela foi uma das principais responsáveis pela inserção, na carta de criação da ONU, da igualdade de direitos entre homens e mulheres.
A Federação Brasileira pelo Progresso Feminino (FBPF), cujo embrião é a Liga pela Emancipação da Mulher, foi fundada por Bertha Lutz em 1922, com objetivo de lutar em prol dos direitos da mulher, incluindo os políticos e civis; participação no mercado de trabalho; acesso a educação, entre outros assuntos pertinentes à busca por equidade. A FBPF contribuiu para a conquista do voto feminino, garantido na Constituição de 1934 e teve sua atuação paulatinamente diminuída após a decretação do Estado Novo em 1937. A entidade continuou a existir, contudo, tendo sido fechada apenas em 1986.
O Fundo FBPF do Arquivo Nacional é dividido em três seções - Bertha Lutz, Administração e Produção intelectual de terceiros. Revela a atuação pioneira da Federação e de uma das suas fundadoras e principais militantes na luta pelos direitos da mulher, especialmente entre os anos 1920 e 1940. O fundo tem documentos textuais (manuscritos e datilografados), iconográficos, sonoros, bibliográficos, cartográficos, e ainda publicações - estas últimas sob guarda da Biblioteca do Arquivo Nacional. Ele é de natureza privada e foi constituído através de doações realizadas por Maria Sabina Albuquerque, então presidenta da Federação, em 1976, após a morte de Bertha Lutz; por Ilka Duque Estrada Bastos, presidenta da Federação, em 1985; por Renée Lamounier e Aída Mendonça de Souza, associadas da Federação, em 1986. Em 2006, uma doação pontual de Maria Luiza Carvalho de Mesquita acrescentou ao fundo um passaporte que pertenceu a Bertha Lutz.
Parte dos documentos textuais do acervo entrou em processo de microfilmagem/digitalização a partir de maio de 2018, fazendo com que uma parcela do fundo se encontre com acesso restrito. Para consultar os conjuntos documentais disponíveis ao usuário, acesse o Sistema de Informações do Arquivo Nacional aqui. O Fundo Federação Brasileira pelo Progresso Feminino (FBPF) possui o código de identificação BR RJANRIO Q0.
O Museu Nacional também compunha a candidatura Feminismo, ciência e política – o legado Bertha Lutz, mas seu acervo a respeito do tema foi perdido no incêndio que atingiu a instituição em 02 de setembro de 2018. Sendo assim, pela primeira vez em sua história, o Comitê Nacional do Brasil do Programa Memória do Mundo da Unesco - MoWBrasil votou pela inclusão de um acervo como patrimônio documental perdido, abrindo o “Registro Nacional do Brasil de Patrimônio Documental Perdido ou Desaparecido”, pois considera que: “Em todos os países, partes significativas do patrimônio documental foram perdidos ou desapareceram. A elaboração de um catálogo público deste patrimônio inacessível na atualidade contribui de maneira decisiva para contextualizar o Programa Memória do Mundo e é um precursor de uma reconstrução virtual da memória perdida e dispersa. Além disso, adiciona urgência e perspectiva aos desafios de identificar e proteger o patrimônio remanescente”.
Confira as outras candidaturas ao Edital MoWBrasil 2018 que foram escolhidas para serem inscritas no Registro Nacional do Brasil do Programa Memória do Mundo da Unesco aqui.